Maria voltou da feira
como quem havia comprado o dia
Proprietária que era agora,
adocicou, a seu gosto, o azedume das manhãs
Para o almoço fez de tudo um pouco,
com seu modo elegante e seu vestido quase roto
Separou da vida o amargo e o caroço
Quando a noite principiou
ela sem titubear, fez das sobras da compra um caldo,
saboreando-o sem nem mesmo experimentar...
Ela o continha.
Maria foi menina de sonhos sempre descalços,
moça da lida sem flor,
mulher que o peso do coração arqueou
No presente faz remendo
no sentimento que insisti em esgarçar
Ela que pensava ter na feira adquirido o dia,
tem no fundo da sacola
uma carne magra, farinha e fubá
Por favor, não acorde Maria
Deixe que ela tenha o direito de se esquivar
às doses diárias de dor,
ao fogão repleto do que não há,
e à conjugação longínqua do verbo amar.
Deixe Maria dormir.
Que ela construa seus sonhos ao seu bel prazer
escondida da consciência dolorida do sofrer
Dorme Maria, dorme...
Amanhã é dia de feira.
Maria, pode dormir...
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